A Agropecuária Jayoro continua despejando centenas de litros de AGROTÓXICOS por via aérea e através de seus tratores nos canaviais e no plantio de Guaraná sem nenhum estudo capaz de aferir a segurança desse procedimento no lençol freático e no ecossistema que circunda esse empreendimento agropecuário.
São muitos os relatos de desenvolvimento de doenças nos trabalhadores da Usina da Coca-Cola, sem contudo, ser deflagrado qualquer procedimento investigatório por partes das autoridades municipais ou dos órgãos estaduais ou federais, enquanto isso são ouvidos relatos de desenvolvimento de câncer de pulmão língua e outros órgãos em trabalhadores dessa empresa.
há relatos de mortes de abelhas e animais silvestres decorrentes da dispersão de agrotóxicos despejados pelos aviões que lançam esses venenos sem que qualquer investigação seja feita.
Estudo aponta subnotificação de
mortes por agrotóxicos, trata-se de trabalho realizado por Graça Portela e Raíza
Tourinho (Icict/Fiocruz) que ao analisar os óbitos decorrentes
de intoxicações ocupacionais por agrotóxicos, registrados pelo Sistema de
Informação sobre Mortalidade (SIM), do Ministério da Saúde, a pesquisadora do
Instituto de Comunicação e Informação Científica e Tecnologia em Saúde
(Icict/Fiocruz) e coordenadora do Sistema Nacional de Informações
Tóxico-Farmacológicas (Sinitox), Rosany Bochner, trouxe à tona um problema
grave de saúde pública: a subnotificação ou notificação irregular dos óbitos
causados por esses agravos, fato que acaba dificultando não só as pesquisas
como também as notificações judiciais contra as empresas produtoras de
agrotóxicos.
É interessante notar que a
intoxicação por agrotóxico não é considerada um agravo de notificação
compulsória no Brasil, embora seja considerada de interesse nacional e
notificada pelas unidades de saúde no Sinan (conforme Portaria nº 777/GM,
28/04/2014). O próprio Ministério da Saúde estima que a subnotificação faz com
que, para cada evento de intoxicação por agrotóxico notificado, há outros 50
não notificados.
Segundo dados do Sinitox, foram
registrados, no período de 2007 a 2011, 26.385 casos de intoxicações por
agrotóxicos de uso agrícola, 13.922 por agrotóxicos de uso doméstico, 5.216 por
produtos veterinários e 15.191 por raticidas. Os agrotóxicos são o terceiro
grupo responsável pelas intoxicações, com 11,8% dos casos. Antecedido pelos
medicamentos (28,3%) e animais peçonhentos (23,7%).
Os óbitos causados por
agrotóxicos de uso agrícola, de acordo com o estudo feito pela coordenadora do
Sinitox, atingiram 863 pessoas (39,4%), os de uso doméstico 29 casos (1,3%), os
produtos veterinários corresponderam a 22 ocorrências (1,0%) e os raticidas por
138 óbitos (6,3%). Segundo levantamento feito por Rosany Bochner, desses óbitos,
apenas 14 (1,3%) foram registrados como ocupacionais.
Rosany Bochner analisou 33 óbitos
registrados no Brasil pelo SIM, no período de 2008 a 2012, levantando variantes
como perfil socioeconômico; ano de óbito, estado e local do acidente, causas
associadas aos óbitos decorrentes de intoxicações, dentre outros pontos. Ela
também cruzou os dados com as informações do Sistema de Informação de Agravos
de Notificação (SINAN)/MS e dados do próprio Sinitox.
O que é a exposição ocupacional a
agrotóxicos
A exposição ocupacional a
agrotóxicos atinge em especial agricultores, que podem ser afetados pela
manipulação direta ou por meio de armazenamento inadequado, reaproveitamento de
embalagens, roupas contaminadas ou contaminação da água. Contudo, trabalhadores
da agricultura e pecuária, de saúde pública, de firmas desintetizadoras, de
transporte e comércio dos agrotóxicos, de indústrias de formulação de
agrotóxicos são os principais profissionais sujeitos à exposição ocupacional a
agroquímicos.
Segundo o relatório divulgado
pelo Inca – Vigilância do Câncer relacionado ao Trabalho e ao Ambiente -, a
exposição aos agrotóxicos pode ocorrer “pelas vias digestiva, respiratória,
dérmica ou por contato ocular”, podendo determinar quadros de intoxicação aguda
(quando os sintomas surgem rapidamente, algumas horas após a exposição
excessiva e por curto período aos produtos tóxicos), subaguda (ocorre por
exposição moderada ou pequena a esses produtos, e tem surgimento mais lento,
com sintomas subjetivos e vagos, tais como dor de cabeça, fraqueza, mal-estar,
dor de estômago e sonolência, dentre outros) e crônica (quando o surgimento dos
sintomas “é tardio, podendo levar meses ou anos, acarretando por vezes danos
irreversíveis, como distúrbios neurológicos e câncer”).
Subnotificação e evento sentinela
E é esse um dos casos analisados
pela coordenadora do Sinitox em seu artigo – o de VMS, residente na comunidade
de Cidade Alta, no município de Limoeiro do Norte, na Chapada do Apodi – Ceará.
Ele trabalhava para uma multinacional na função de trabalhador agrícola, tendo
sido transferido para o almoxarifado químico, onde trabalhava como auxiliar no
preparo da solução de agrotóxicos para borrifo na lavoura de abacaxi. Mesmo
utilizando equipamentos de proteção individual (EPI), a partir de 2008 VMS
passou a sentir fortes dores de cabeça, febre, falta de apetite, olhos
amarelados e inchaço no abdômen. Em agosto desse ano, houve piora em seu quadro
clínico, obrigando-o a afastar-se do serviço. Em novembro, faleceu, aos 31
anos.
Se para alguns estava clara a
intoxicação por agrotóxicos, para a Justiça havia a necessidade de se provar
que de fato a intoxicação foi o que levou VMS a morte. As evidências vieram dos
estudos feitos pela pesquisadora e professora do Departamento de Saúde
Comunitária, da Faculdade de Medicina da Universidade Federal do Ceará (UFCE),
Raquel Rigotto, que junto com a sua equipe multidisciplinar, comprovou que
todos os problemas de saúde do paciente foram ocasionados pela exposição
ocupacional aos agrotóxicos. Veja o vídeo abaixo.
Em 2013, a Justiça reconheceu que
a morte de VMS foi motivada “pelo ambiente ocupacional”, ou seja, pelo trabalho
com substâncias agrotóxicas. Para Rosany Bochner, “chama a atenção o fato de
que dentre as causas apresentadas [na certidão de óbito], os agrotóxicos não
foram sequer mencionados, implicando na fragilidade do SIM, em subsidiar as
análises dos impactos dos agrotóxicos na saúde humana”. Em seu artigo, Rosany
Bochner ressalta que “segundo o sistema, VMS seria mais uma vítima do
agronegócio, que morre sem deixar vestígios da relação causal entre a exposição
a agrotóxicos e o agravo à saúde”.
Paulo Borges, coordenador do
Programa de Pós-Graduação em Informação e Comunicação em Saúde (PPGICS/Icict),
que pesquisa os sistemas de informações, analisa que o preenchimento inadequado
– o subregistro, ou seja, casos de doenças e/ou óbitos que não são registrados
é um dos principais problemas dos SIS (Sistemas de Informações) e que isto
“pode gerar informações subestimadas, não condizentes com a realidade local”.
Borges também alerta para outro
fator preocupante que é o fato dos formulários/declarações que alimentam os SIS
não serem completamente preenchidos, deixando de fora informações relevantes
para a vigilância epidemiológica, o que se reflete inclusive nas doenças
ocupacionais: “A intencionalidade e a exposição ocupacional relacionada aos
óbitos e algumas doenças também costumam ser subregistradas, pois nem sempre o
profissional de saúde que preenche o documento possui esta informação ou tem
clareza sobre a importância da mesma para as ações de prevenção de novas
ocorrências”, afirma. Ele acredita que o fato dos profissionais de saúde
estarem muito envolvidos com a assistência aos pacientes, não permite que eles
observem a importância que o registro adequado das informações tem para a
vigilância e prevenção de novas ocorrências.
Para ele, uma das formas de se
reduzir o problema é a conscientização do profissional de saúde sobre a
necessidade do preenchimento correto: “É claro que as questões tecnológicas
relacionadas as interfaces, a usabilidade e a transmissão dos dados podem ser
melhoradas, mas creio que o mais importante é conscientizar os profissionais de
saúde sobre a importância destes sistemas para a saúde das populações”,
finaliza.
“Vítimas escondidas”
Ao fazer a correlação entre as
mortes registradas no SIM e a real causa desses óbitos, Rosany Bochner traz à
tona uma discussão que pode trazer impactos relevantes não só para o Sistema
Único de Saúde, como para a saúde do trabalhador: “Ao lidar com óbitos
decorrentes de intoxicações ocupacionais por agrotóxicos, estamos na presença
de eventos raros, dificilmente notificados, mas que aportam uma enormidade de
significados e sentidos, mantendo atrás de si diversas outras vítimas de um
sistema perverso”, afirma ela, em seu artigo.
Em sua busca por “vítimas
escondidas”, Rosany Bochner tenta mostrar que mais do que números, esses óbitos
representam pessoas que estão sendo expostas diariamente em seus trabalhos com
agrotóxicos. No lugar de VMS, por exemplo, é bem possível que exista outro
trabalhador, submetido a condições semelhantes que causaram a morte do
primeiro. Assim, o artigo propõe “utilizar cada um desses óbitos descritos
nesse trabalho como um evento sentinela, a fim de incentivar e instrumentalizar
as vigilâncias dos municípios a atuar na fiscalização das condições de trabalho
e, se possível, realizar busca ativa de casos de intoxicação crônica por
agrotóxicos”. Ou seja, a partir de informações de uma intoxicação (o evento
sentinela) a Vigilância deve buscar no local de ocorrência (busca ativa) casos
semelhantes. Como ela mesmo afirma: “Esse trabalho é um início para um novo
modelo de vigilância e captação de dados”.
Esta reportagem marca o início da
série Agrotóxicos: a história por trás dos números, realizada pelo Instituto de
Comunicação e Informação Científica e Tecnologia em Saúde (Icict/Fiocruz), com
matérias sobre uso de agrotóxicos no Brasil.
in EcoDebate, 15/12/2015
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